Recapitulando o Debate sobre network fees em 2024
(Texto original publicado em: https://www.pedagionainternet.com.br/post/recapitulando-o-debate-sobre-fair-share-em-2024)
O ano de 2024 foi marcado por uma série de discussões sobre a proposta de Fair Share, tema que ganhou destaque global pelas suas implicações na neutralidade da rede e no acesso livre à Internet. No Brasil, o debate se intensificou com as consultas sobre o tema abertas pela ANATEL e pela campanha do ITS Rio e ISOC Brasil do ‘Pedágio na Internet’. Recapitulemos alguns dos momentos mais significativos desse último ano.
Em fevereiro, a Anatel propôs uma nova tomada de subsídios sobre a regulamentação dos deveres dos usuários, sendo esta a segunda consulta consecutiva sobre o tema, após a Anatel já ter aberto debate anteriormente em 2023.
Em março, em resposta às declarações controversas do Presidente da Anatel, o ITS Rio e a ISOC Brasil elaboraram e divulgaram uma Carta Aberta em defesa da Neutralidade de Rede, que recebeu amplo apoio de diversas instituições e pessoas de múltiplos setores.
Em abril, a FCC nos Estados Unidos sinalizou uma reavaliação da neutralidade de rede, indicando uma possível mudança que poderia influenciar as discussões globais sobre Fair Share.
Por sua vez, maio foi um mês crucial para esse debate, uma vez que, nos Estados Unidos, a restauração da neutralidade de rede reforçou o apoio a medidas semelhantes em outras regiões, incluindo o Brasil. Além disso, o Fórum da Internet no Brasil (FIB), realizado em Curitiba de 21 a 24 de maio, organizado pelo NIC.br e CGI.br, se tornou um ponto de encontro vital para essa discussão.
Durante o evento, a ISOC Brasil organizou o painel “Pedágio na Internet? Os impactos do pedágio à neutralidade da rede” no Dia Zero, moderado por Raquel Gatto e com a participação de Breno Vale (ABRINT), Mozart Tenório (Anatel), Flávia Lefèvre (CDR), e João Victor Archegas (ITS Rio), onde se discutiu como as propostas de Fair Share poderiam afetar a neutralidade da rede e a livre concorrência. Este painel destacou argumentos técnicos contra o Fair Share, enfatizando como tais medidas poderiam impor custos desproporcionais aos consumidores e restringir o acesso a serviços de Internet de qualidade.
Outro destaque do FIB foi o painel “Fair share no setor das telecomunicações: desafios e perspectivas do compartilhamento de custos para expansão das redes”, organizado pelo Legal Grounds Institute, com a presença de especialistas como Alessandro Molon (AIA), Camila Tapias (Telefônica Brasil), Carlos Baigorri (Anatel), Paula Bernardi (ISOC) e Ricardo Campos (Legal Grounds). As discussões focaram nos desafios regulatórios e econômicos que o Fair Share impõe.
Em agosto, a intervenção do Ministério da Fazenda na consulta pública da Anatel sobre o Fair Share trouxe considerações econômicas cruciais para o debate, ressaltando a potencial influência dessa política sobre a economia digital e a infraestrutura de telecomunicações. O Ministério apontou que a imposição de taxas de rede criaria barreiras financeiras desproporcionais para novos entrantes e pequenos provedores, afetando a competição e a inovação no setor. Além disso, destacou o impacto sobre os consumidores finais, com possível aumento de custos e diminuição na qualidade do serviço de Internet.
Em setembro, a renúncia de Thierry Breton como Comissário da União Europeia trouxe reflexões importantes sobre as políticas de network fees. Breton era um defensor notável das taxas de rede, argumentando que elas eram essenciais para garantir investimentos em infraestrutura digital. Sua saída destacou a divisão na Europa sobre esta questão e serviu como um alerta para o Brasil. Compreendeu-se que, embora o financiamento da infraestrutura seja crucial, é igualmente importante considerar as implicações mais amplas de tais taxas sobre a equidade e o acesso aberto à Internet.
Em novembro, no LACIGF, no Chile, o ITS Rio e a ISOC Brasil promoveram uma programação completa sobre a proposta de Fair Share e participaram de um painel que reuniu especialistas defendendo o acesso livre e a neutralidade da rede como essenciais para a democracia digital.
Em dezembro, dois acontecimentos notáveis se destacaram no debate sobre o fair share: a aprovação do relatório do PL 469/2024, que proíbe a cobrança de taxas sobre o uso da infraestrutura da Internet e a publicação do Dossiê de Impacto à Internet pela ISOC Brasil. Este dossiê examinou a "Proposta de Modelo de Remuneração de Prestadores de Serviços de Telecomunicações de Grandes Usuários" proposta pela Conexis, sob a Tomada de Subsídios nº 26/2023 da ANATEL.
A proposta da Conexis defende que grandes plataformas digitais deveriam contribuir mais para os custos de infraestrutura de rede, devido ao volume significativo de dados que geram. Como contraponto, o dossiê da ISOC Brasil detalhou os impactos adversos que tal modelo poderia ter sobre a neutralidade da rede, a fragmentação da Internet e o aumento dos custos para os usuários finais, além de possíveis barreiras para novos entrantes e pequenos provedores.
Em 2025, seguiremos no monitoramento das propostas de Fair Share sempre em defesa de uma Internet livre e justa.